Um mecanismo criado pelo Banco Central (BC) para facilitar a devolução de transações feitas com Pix em casos de fraude ou falha operacional permitiu o retorno de cerca de R$ 317 milhões a usuários do serviço só em 2024 (até julho). Desde novembro de 2021, o montante total reembolsado superou o R$ 1 bilhão.
De acordo com dados do BC, por meio do Mecanismo Especial de Devolução (MED), foram registrados 2,5 milhões de pedidos de devolução por fraudes entre janeiro e julho deste ano, sendo que 68% das solicitações foram rejeitadas. O valor recuperado com o mecanismo nesse período foi de R$ 284 milhões, cerca de 8% do total.
Houve também 63 mil casos registrados envolvendo falhas operacionais nos sete primeiros meses deste ano. Nessa modalidade, foram devolvidos por volta de R$ 33 milhões dos R$ 73 milhões em pedidos vinculados às solicitações (45,1%).
O baixo índice de devoluções por casos de fraudes e falhas por Pix se dá pela velocidade das solicitações, afirma o chefe do departamento de competição e de estrutura do mercado financeiro do BC, Breno Santana Lobo. Segundo ele, os golpistas tendem a movimentar os valores entre diferentes contas, impedindo o funcionamento do MED, que só fica disponível se houver recursos na conta de destino.
Lobo diz ainda que os bancos têm um prazo de 30 minutos para abrir as solicitações de devolução junto ao BC após a identificação do caso, com intenção de garantir mais velocidade ao processo.
Já nos casos de falhas operacionais, ele afirma que, em geral, os bancos se comunicam e relatam erros pontuais, realizando a transação dos valores enviados incorretamente.
“São casos em que lidamos com a boa-fé dos bancos. Se depois a outra parte entender que houve prejuízo ou foi uma operação fraudulenta, o Banco Central vai analisar o caso, e se chegar à conclusão de que houve má-fé a instituição pode ser punida”, afirma.
Uma fraude que tem se tornado comum entre os golpistas envolve o uso do próprio mecanismo de devolução. Funciona assim: ao receber um Pix indevido, o usuário é contactado pelo fraudador, que passa uma chave diferente da original da transação. Agindo de boa-fé, a pessoa realiza o pagamento para essa outra chave.
Além disso, após essa movimentação, os golpistas abrem um protocolo no mecanismo do BC e afirmam terem sido vítimas de golpe. Como houve movimentação recente na conta do usuário, os bancos entendem que realmente houve uma fraude, e se houver o saldo o valor é debitado da conta do usuário. Dessa forma, o dinheiro sai da conta da vítima duas vezes.
O sócio de bancos e serviços financeiros do escritório Mattos Filho Paulo Brancher afirma que sempre vão existir falhas em sistemas operacionais e o que precisa ser feito é melhorar os mecanismos de controle.
“Uma vez que existe a percepção de uma ineficiência no sistema e que está acontecendo uma fraude, é preciso pensar em quais são as melhorias que vão ser aplicadas para tentar evitar”, diz Brancher.
De acordo com Larissa Arruy, também sócia do Mattos Filho, o BC e as instituições financeiras têm feito o dever de casa e estão demonstrando uma preocupação recorrente com casos de fraude. “Existe uma combinação que são os procedimentos que o Banco Central está estabelecendo e a atenção que as instituições de pagamento estão tendo com seus próprios controles internos, que estão se tornando cada vez mais robustos”, diz.
Ao jornal Valor Econômico, o BC informou que já existe um grupo de trabalho, formado por entidades de bancos e de pagamentos financeiros, discutindo a criação de uma “MED 2.0”. A nova versão do mecanismo deve ser entregue no final do próximo ano ou no começo de 2026 e poderá rastrear todas as transações Pix que saírem da conta original. A tecnologia possibilitará a comunicação entre bancos, que realizarão os bloqueios em todas as contas eventualmente operadas por golpistas. “Com isso a gente aumenta a chance de reaver mais recursos”, diz Lobo, do BC.
O chefe de departamento da autoridade monetária afirma que uma das principais dificuldades que o BC enfrenta neste âmbito é a falta de educação digital da população.
“A gente não consegue conversar com todo mundo, por mais que tente. Além da falta de velocidade nas solicitações, tem pessoas que nem conhecem o mecanismo, e isso dificulta muito a atuação do regulador.”
As informações são do jornal Valor Econômico.